Donnerstag, 19. März 2009
12 homens e uma sentença.
Há uma frase que ouvi anos atrás que diz: "Se você só sabe usar martelos, tratará tudo e todos como um prego", mas confesso desconhecer a autoria embora me lembre muito bem do seu sentido. Essa frase é uma crítica à forma como tratamos as pessoas e os acontecimentos da vida. Ela diz que, em geral, não lidamos com as pessoas, problemas, situações, eventos, mas sim com nossa própria visão subjetiva destes. Em outras palavras, lidamos com os rótulos que aplicamos à eles.



E os rótulos estão por toda parte. Alguns constituem preconceito, como o racismo. Outros constituem um tremendo auto-engano, como a idéia que temos de nós mesmos, que raramente coincide com a idéia que os outros tem de nós. Nossa opinião sobre um assunto qualquer não passa de uma opinião sobre o rótulo que colocamos nesse assunto qualquer (o que pode incluir inclusive a opinião que disponho aqui!). Assim, os rótulos representam nossa própria visão da realidade, nossa maneira de ver as coisas. Tomamos decisões, agimos, reagimos ou optamos por ignorar tudo e todos com base nos rótulos que criamos.

E é possível fugir dessa "maldição", dessa subjetividade? Talvez não. Mas só o fato de tomarmos consciência dela já é um começo pois nos leva a pensar sobre isso. Felizmente não estamos sozinhos, muitos já começaram a fazer isso há tempos: A ciência nada mais é do que uma maneira de tornar o conhecimento mais objetivo, fugindo o quanto pode da subjetividade (ou seja, dos rótulos que colocamos na realidade). Partindo do princípio de que uma opinião emitida por um único indivíduo sempre será subjetiva, ela usa revisão por pares, raciocínio lógico rigoroso e empirismo de forma a tornar o conhecimento mais objetivo. Será que a ciência consegue realizar essa façanha por completo? Talvez sim, talvez não, mas penso ser ela nossa melhor "martelada" até o momento.

A consciência de que convivemos não com a realidade objetiva mas sim com nossa visão dela (subjetiva, a partir dos rótulos que colocamos nela) pode ser um divisor de águas no pensamento de um indivíduo (assim como o foi para mim anos atrás). Para entender o que quero dizer, basta trazer o assunto para um contexto mais pragmático: Quantas vezes discutindo um assunto qualquer não acabamos "colocando palavras na boca do outro", lidando com argumentos e realidades fora do contexto da discussão ou sequer citados pelo outro? Quantas vezes não lemos um texto e lá pela metade já julgamos "ter lido o suficiente" para compreender a mensagem do autor e imediatamente começamos a emitir nosso julgamento? Será que nesse estágio realmente compreendemos a mensagem ou apenas conseguimos encaixá-la em um rótulo já existente em nossa mente? O que fazer então? Devemos aplicar a metodologia científica em toda e qualquer conversa de bar? Pedir ao garçom que revise nossas conclusões? A partir de que momento uma visão ou opinião deixa de falar de um rótulo e passa a ser objetiva ou algo o mais próximo possível disso? Penso que toda resposta à essas indagações será inexata. Mas acredito que o melhor a se tirar dessa discussão está na palavra penso.

Pensar é um ato que se revela de uma dificuldade monumental a partir do momento em que passamos a nos perguntar "estou rotulando ou realmente compreendi a mensagem do outro?". No mínimo nos tornamos mais tolerantes, por tomarmos consciência de nossa própria limitação e da fragilidade de nossas bases para emitirmos opiniões e pensamentos. Passamos a questionar nossa própria capacidade de julgamento. Aquilo que antes era "velho conhecido" ou "óbvio" passa a ser um rótulo antigo e imperfeito.

Quando nos colocamos a pensar, aprendemos a questionar os temas e não os locutores, ou autores, aprendemos a debater e não a combater.

O filme de 1957, 12 homens e uma sentença, cujo título original é "12 angry men", demonstra isso de maneira magistral. O filme é sobre o julgamento de um garoto acusado de assassinato. Os 12 homens são o júri cujo desígnio é decidir o destino do rapaz. A decisão precisa ser unânime e caso o rapaz seja considerado culpado, será levado à cadeira elétrica. No decorrer do filme, mesmo inconscientemente, cada membro do júri expõe o rótulo em que encaixa o garoto. No final do filme, percebe-se que, no decorrer do processo, ninguém, absolutamente ningúem estava de fato julgando o caso. Todos estavam julgando o rótulo em que haviam encaixado o pobre garoto. A um deles, por exemplo, o garoto era um vândalo devido ao lugar que morava "pois todos lá são vândalos", isso fazia com que visse todos os argumentos a favor de seu rótulo como "inconstestáveis" e os demais como mera "balela".

Você tem algum pensamento que julga ser "incontestável"?
No filme, apenas um dos jurados (interpretado por Henry Fonda) se atreve a pensar sobre o caso, o que muda completamente o destino do garoto. O que não mudaria na nossa realidade se nos dispuséssemos a questionar nossos rótulos , guardar nossos martelos e ousássemos pensar?

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